
“Nenhuma célula rebelde em mim”
Duas horas antes de escrever esta
frase, recebi um telefonema de um amigo cujo filho adulto havia acabado de ser
informado pelo médico de que os profissionais médicos tinham feito tudo o que
podiam e, salvo um milagre, o câncer seria fatal. Este seria o segundo filho
que meu amigo perderia para o câncer. Menciono isso porque estou dolorosamente
ciente de que nem todos recebem um indulto do diagnóstico de câncer como
aconteceu comigo – até agora.
Existem várias ironias envolvendo
minha própria experiência com câncer. Minha biópsia para câncer de próstata
aconteceu em nosso trigésimo sétimo aniversário de casamento, e a cirurgia para
remover a glândula cancerosa aconteceu no Dia dos Namorados. Tudo bem se você
sorrir, mesmo que o câncer não seja motivo de riso.
Exame de rotina, tudo mudou
Deixe-me definir o cenário. Foi
um exame de rotina com o meu urologista, depois de anos lidando com os efeitos
perturbadores de uma próstata aumentada. Eu tinha sessenta anos e, pensava, com
boa saúde. É estranho como nós presumimos que estamos com boa saúde quando, na
verdade, não temos ideia do que está crescendo dentro de nós.
Quando as pessoas me perguntam
agora: “Como está sua saúde”? Eu nunca digo “Tudo bem”, como eu costumava
fazer. Eu digo: “Eu me sinto bem”. O que, traduzido, significa: “Não sei como
estou, só Deus sabe. Pelo que sei, eu poderia ter um câncer fatal, ou um
aneurisma aórtico que explodirá amanhã, ou um coágulo de sangue na minha perna
que irá se desprender esta noite e causar um derrame fatal enquanto durmo.
Eis o que mudou nesse simples
hábito de dizer “Tudo bem”. Meus exames de rotina terminaram. Mas o médico
disse: “Eu percebi algumas irregularidades. Eu gostaria de fazer uma biópsia”.
Pausa. Então falei: “Ok, se você está dizendo, quando”? “Agora”, ele disse”, se
você tiver tempo”. Pausa novamente, enquanto tudo se desmorona “Claro”.
Ele me leva para outra sala de
exames, diz para eu colocar o roupão pendurado no gancho e diz que voltará em
alguns minutos com o equipamento para a biópsia. Ele sai e me deixa sozinho.
Um Presente Perfeitamente
Cronometrado
Nesse ponto, você se lembra de
seus melhores amigos – aqueles com quem você passa mais tempo e que lhe dizem o
que você mais precisa ouvir, e no momento certo que precisa ouvir. Bem, eu
havia passado um tempo significativo naquela manhã com meu amigo, o apóstolo
Paulo. Na verdade, eu amei tanto suas palavras naquela manhã que eu as
memorizei.
Enquanto eu estava sentado na
mesa de exames com minhas pernas penduradas para fora, usando meu vestido de hospital
com uma abertura nas costas, e sem saber pelo que esperar, as palavras de Paulo
voltaram a mim.
“Porque Deus não nos destinou
para a ira, mas para alcançar a salvação mediante nosso Senhor Jesus Cristo,
que morreu por nós para que, quer vigiemos, quer durmamos, vivamos em união com
ele”. (1Ts 5. 9-10)
Este foi um presente maravilhoso
para mim. Perfeitamente cronometrado, perfeitamente expresso. Paulo havia me
falado aquelas palavras naquela manhã. Mas Deus é que havia providenciado para
que eu as lesse durante minhas devocionais. Deus colocou em meu coração para
memorizá-las. Deus as trouxe à minha mente na sala de exames. E Deus me deu a
fé para abraçá-las como o presente mais doce que ele poderia me dar naquele
momento. Sim, ainda mais doce do que “você está saudável”.
Nenhuma célula Rebelde
Mas Paulo foi o instrumento de
Deus. Seu porta-voz. Seu emissário para minha necessidade. Eu conhecia a voz de
Deus, porque conhecia a voz do seu embaixador. Esse era o meu velho amigo
Paulo. Estas são as notícias sob medida que ele me deu:
Primeiro, ele me disse: “O que
você está prestes a experimentar – câncer ou não – não é ira! Se você tiver
câncer, não é um castigo de Deus”.
Para sentir toda a força disso,
você precisa entender que compartilho da convicção inabalável de Paulo de que
Deus está absolutamente no controle em relação a se alguém tem ou não câncer.
Paulo disse: “Porque dele, e por meio dele, e para ele são todas as coisas. A
ele, pois, a glória eternamente. Amém”! (Rm 11.36). Ele disse: “daquele [Deus]
que faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade, (Ef 1.11).
Então, quando Paulo me disse:
“Isso não é a ira de Deus”, ele não quis dizer: “Se você tem câncer, não é de
Deus.” Não. Não. Se eu tiver câncer (o que eu tive), é certamente devido aos
propósitos finais de Deus. Deus controla todas as moléculas do universo. Ele é
Deus! Não há células rebeldes fora de seu controle.
O que Paulo quis dizer quando
falou: “Isso não é a ira de Deus”, é que, sendo câncer ou não, “Deus não está
punindo você”. Isso não é punição. Deus tem seus propósitos, mas eles não
incluem punição por causa do meu pecado. Deus é todo misericordioso, todo amor.
Como eu sei disso? Paulo responde a essa pergunta. Eu voltarei a ele no ponto
número quatro abaixo.
Melhor que não morrer
Segundo, Paulo me falou, enquanto
eu esperava pelo médico, sobre o lado positivo de “Isso não é ira”. Ele disse:
“Deus não te destinou para a ira, mas para alcançar a salvação”.
Este câncer não é ira. É o
caminho para a salvação. A salvação é a contraparte positiva para ausência de
ira. Ele disse: “A biópsia indicará “livre de câncer”, você será salvo de ter
câncer”? Não. Não foi isso que ele quis dizer.
Não há dúvidas sobre isso. Paul
disse, na verdade, que eu poderia morrer do câncer que eles estavam prestes a
detectar. Então, em que consiste a salvação? Ele vai chegar lá.
Terceiro, Paulo me disse que Deus
não garante que eu escape da morte desse câncer.
Ele disse que eu seria salvo
“quer estivesse acordado ou dormindo”. Isso significa “se você viver ou
morrer”. Paulo chamou a morte de sono não porque após a morte não há comunhão
consciente com Jesus (Fp 1.23), mas porque o corpo de um cristão morto parece estar
dormindo, e esse corpo será ressuscitado dos mortos (como do sono) no último
dia (1Co 15.20).
Você pode pensar que pudesse ser
pequeno o conforto – de não ser informado de que eu iria sobreviver a esse tipo
de câncer. Mas não foi assim que funcionou. O que eu precisava naquele momento
era um conforto muito mais sólido, duradouro e inabalável do que viver mais
alguns anos de vida após o câncer. Eu precisava do que eu já tinha: “Isso não é
ira. Você está destinado à salvação. E isso é verdade – absolutamente verdade –
se você viver ou se morrer”!
Antes de tudo
Quarto, Paulo deu a resposta
impressionante à pergunta que deixei aberta no final do ponto número um: “Como
você sabe que esse câncer não é um castigo de Deus por seus pecados”? Resposta:
porque Cristo já morreu por meus pecados. Com câncer ou sem câncer, com morte
ou vida, Paulo me disse que eu iria “obter a salvação através de nosso Senhor
Jesus Cristo, que morreu por mim”.
Em momentos como esses,
percebemos por que Paulo disse: “Antes de tudo, vos entreguei…: que Cristo
morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras, e que foi sepultado e
ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras”. (1Co 15.3–4). “Antes de
tudo” é que “Cristo morreu por nossos pecados”. Por quê?
Porque, se ele já morreu por
eles, não morreremos por eles. Isso seria um duplo risco. Essa foi a razão pela
qual ele veio – que a minha condenação sob a ira de Deus (Jo 3.36) foi
suportada por Jesus quando ele morreu na cruz (Rm 8.3). A pessoa que está unida
a Cristo pela fé nele “não entra em juízo, mas passou da morte para a vida” (Jo
5.24).
É por isso que Paulo disse:
“Agora, pois, já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus”. (Rm
8. 1). Nenhuma condenação porque Cristo já suportou a condenação. Nenhuma ira porque
Cristo suportou a ira. Foi isso que Paulo me disse com tanta clareza e firmeza
e alegria, enquanto eu esperava pela biópsia: “Este câncer não é ira”.
Promessa pessoal
A última coisa que Paulo me disse
foi muito pessoal – a saber, o que ele queria dizer com salvação. “Deus não te
destinou para a ira, mas para obter a salvação por nosso Senhor Jesus Cristo,
que morreu por [você] para que, quer [você] esteja acordado ou dormindo, [você]
possa viver com ele”.
Quer você viva ou morra, você
viverá. Mas não apenas viver em alguma imortalidade enevoada e não especifica,
mas, muito especificamente, você “viverá com ele” – aquele que morreu por você
e ressuscitou. O que significa pelo menos duas grandes verdades. Uma é que eu
vou viver para sempre, já que em quem eu vivo não pode morrer. “havendo Cristo
ressuscitado dentre os mortos, já não morre”; (Rm 6.9). A outra é que eu posso
viver para sempre com aquele que me amou o suficiente para morrer por mim. Esta
é uma promessa muito pessoal e profundamente satisfatória.
O médico me ligou no dia seguinte
e disse: “Você tem câncer. Gostaria de me encontrar com você e sua esposa
quando for conveniente para vocês e discutir suas opções”. Decidimos pela opção
radical: retirá-la. Isso aconteceu sete semanas depois – no Dia dos Namorados.
Isso foi há doze anos. Como eu estou indo? Eu me sinto bem.
Por: John Piper. © DesiringGod
Foundation. Website: desiringGod.org. Traduzido com permissão. Fonte: No
Maverick Cells in Me.
Original: Minha esperança mais
profunda durante o câncer. © Voltemos ao Evangelho. Website:
voltemosaoevangelho.com. Todos os direitos reservados. Tradução: Paulo Reiss
Junior. Revisão: Filipe Castelo Branco.
John Piper é doutor em Teologia
pela Universidade de Munique e fundador do desiringGod.org e chanceler no
Bethlehem College & Seminary. Ele serviu por 33 anos como pastor principal
da Bethlehem Baptist Church em Minneapolis, Minnesota. Piper é autor de
diversos livros, incluindo Uma Glória Peculiar, Lendo a Bíblia de Modo
Sobrenatural e Surpreendido por Deus, publicados pela Editora Fiel.
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